ORGANIZAÇÕES INOVADORAS SUSTENTÁVEIS

Moysés Simantob

José Carlos Barbieri

 

Tratar do binômio inovação e sustentabilidade requer um certo resgate histórico. Entender  a profundidade dos temas exige um elevado grau de abertura da mente e unir os dois termos na perspectiva organizacional é o desafio que temos adiante. Um desafio que nos  colocará  em contato com as nossas próprias crenças e descrenças em relação aos temas, produzindo em cada  um de nós uma reflexão serena e silenciosa, onde crenças  e descrenças possam ser confrontadas  na tentativa de se encontrar um ponto de vista comum para o que passaremos a chamar de OIS – Organizações Inovadoras Sustentáveis.

Considerando que não há consenso a respeito dos dois termos qualificadores da organização, apesar de que muitas páginas já foram escritas sobre eles, e tendo-se em conta que    as inovações têm chamado a atenção dos estudiosos desde as épocas mais antigas, só mais recentemente tornou-se uma espécie de mantra entre organizações de diversos portes e culturas.

É comum considerar a obra de Schumpeter, do começo do século passado,  como um  marco para o seu estudo sobre a perspectiva das organizações. Inovação é para ele sinônimo de progresso econômico e consiste essencialmente na alocação de recursos produtivos em usos ainda não experimentados. Seu conceito de inovação tornou-se amplo para abarcar as diferentes possibilidades de introdução de novidades no sistema econômico pelos produtores, envolvendo desde a melhoria da qualidade de um certo bem até o estabelecimento de uma nova organização.   É dele a distinção entre inovação radical e incremental em meio a outras tantas tipologias que vieram mais tarde, com o mesmo intuito de se classificar as inovações em graus de impacto no mercado, intensidade, amplitude e foco.

Os entendimentos a respeito das inovações tornaram-se elásticos para dar conta da sua imensa complexidade. Desde então e até os dias de hoje observa-se que persistem dúvidas sobre    o real significado das inovações quando se pretende delimitar o seu significado para efeito de algum entendimento específico, como é o caso deste texto com respeito à expressão organização inovadora. Isso se deve em grande parte pelo fato das inovações estarem em todas as partes e as novidades serem tantas e em todos os campos da atividade econômica que praticamente nada fica alheio a elas.

Compreender os fenômenos sociais e econômicos que alteram a ordem do mercado foi também alvo de estudos de Schumpeter que, para expressar tais mudanças, cunhou a expressão Destruição Criativa – o processo de mudanças incessantes que substitui o antigo pelo novo e revoluciona continuamente as estruturas econômicas, gerando a instabilidade que caracteriza a dinâmica do sistema capitalista. Diante dessa contínua torrente de novidades que caracteriza o sistema capitalista, cabe a pergunta: o que vem a ser efetivamente uma organização inovadora?  Ou, dito de outro modo, o que se entende por organização inovadora?

 

 

Organização Inovadora 

Esta pergunta não comporta resposta fácil, pois a palavra inovadora pode referir-se a qualquer novidade que esteja sendo introduzida pela organização. Lembrando, a  palavra  inovadora é um adjetivo que se aplica a quem introduz novidades. Para muitas organizações as novidades são impostas a elas de fora para dentro. As novidades que introduzem em seus  produtos, processos e negócios decorrem de pressões ou exigências de clientes, fornecedores, agentes financeiros, órgãos governamentais, entre outros. Assim, as razões para inovar podem ser definidas em seis tipos de estratégias de inovação, conforme as tabelas abaixo, adaptada pelos autores de abordagem de Freeman e Soete:

 

Estratégia O que é? Objetivo Empresas Exemplo
TRADICIONAL Não inovar ou limitar-se à adoção de inovações de processo desenvolvidas por outros Manter o status quo ·      Produção de produtos comuns

·      Baixos custos de produção

·      P&D&E exógeno

·      Vantagem do trabalho manual

·      Agricultura

·      Construção Civil

·      Alimentação

·      Artesanato

·      Decoração

OFENSIVA Introdução de novos produtos e processos no mercado Ser      líder           do mercado ·      P&D&E interno

·      Cooperação externa

·      RH altamente qualificados

·      Bom sistema de informação

·      Visão de longo-prazo

·      Portfólio de produtos

·      Bell: semicondutores

·      Du Pont: nylon

·      RCA: TV

DEFENSIVA Pequenas melhorias de produtos e processos existentes Não ficar para trás ·      P&D&E interno

·      Cooperação externa

·      RH altamente qualificados

·      Bom sistema de informação

·      Visão de longo-prazo

·      Portfólio de produtos

Sistema de vídeo: PAL versus VHS

 

 

Estratégia O que é? Objetivo Empresas Exemplo
IMITATIVA Adotar tecnologias desenvolvidas por outros Não ficar obsoleto ·      Fortes na produção e no design

·      Fortes na aquisição de informação técnica

·      Serviços técnicos

·      Formação técnica

·      Equipamento elétrico

·      Indústria química

DEPENDENTE Subordinação a outras empresas (clientes ou empresa-mãe) Satisfazer as exigências dos clientes ou da empresa-mãe ·      Subcontratadas ou filiais

·      Encomendas de clientes ou da empresa-mãe

·      Clientes como fonte de inovação

Fornecedores de componentes
OPORTUNISTA Identificação de oportunidades em mercados em mudança Melhorar a sua posição através do aproveitamento das oportunidades ·      Marketing

·      Flexibilidade

·      Informação externa

 

 

Algumas organizações se utilizam de inovações esporádicas em produtos e serviços, resultando, em certos casos, em picos de vendas, de efeito temporário, declinando com o tempo fruto do ingresso de produtos substitutos e pela imitação de outros competidores. Não raro, estas empresas se submetem a um ´vale´ (um hiato entre a inovação bem sucedida e as próximas) onde por força da inércia organizacional ou da exigência de novas pesquisas e  desenvolvimentos acabam por retardar o fluxo de novos lançamentos e, por conseguinte, mudam o foco de uma estratégia ofensiva para uma defensiva.

A organização que vivencia esses ´picos e vales´, sem sombra de dúvida, realiza uma inovação, se medida apenas pelo sucesso de uma iniciativa, mas quando observada a sua linha do tempo, e a sua trajetória de buscar continuamente a liderança do mercado seria  este  fato  suficiente para caracterizá-la como uma organização inovadora?

A resposta depende do significado que se pretende dar ao adjetivo inovadora. Se por inovadora se entende a organização que realiza inovações de modo reativo  devido às exigências  de terceiros, então a resposta é não. Porém, a resposta será sim, caso se pretenda usar o adjetivo para as que apresentam uma estratégia sistemática em relação à produção de inovações que implementam, em outras palavras, uma postura pró-ativa, ofensiva.

Inovações também podem surgir como resultado de um aprendizado passivo, porque o simples fato de produzir bens e serviços sempre gera algum tipo de mudança que irá beneficiar a organização. Aqui a novidade é um subproduto das atividades normais ou rotineiras de uma organização e por esse motivo elas também ocorrem em organizações muito conservadoras ou até mesmo nas retrógradas e esclerosadas. Então todas as organizações seriam de alguma forma inovadoras? Se a resposta for sim, a busca de significado específico para o adjetivo deixaria de fazer sentido e o assunto estaria encerrado. A resposta é não, se com a palavra inovadora se pretende exprimir uma dose de intencionalidade quanto às atividades geradoras de novidades.

O Manual de Oslo, que estabelece critérios para mensurar as inovações tecnológicas do setor privado, referindo-se à inovação de produto e processo, considera inovadora a empresa que tenha implementado com sucesso produtos ou processos tecnologicamente  novos  ou  aprimorados, ou combinações de produtos e processos, durante o período de mensuração. Pode-se estender esse entendimento para todas as inovações organizacionais e negociais. Os esforços para inovar resultam, inicialmente, em idéias, invenções, modelos, planos e programas antes de se tornarem inovações. Vale lembrar que Schumpeter já alertava para a diferença entre invenção e inovação. Segundo suas palavras, a invenção por si só não produz nenhum  efeito  economicamente relevante, portanto, por inovação pode se entender o esforço para transformar idéias e invenções em resultados para a organização. Para o Forum de Inovação da FGV- EAESP, a inovação é definida pela seguinte expressão:

 

inovação = idéia + implementação + resultados

 

na qual: idéia = conhecimento, informação, sugestão, visão, plano, modelo e qualquer outro meio capaz de representar a concepção mental de algo concreto ou abstrato;

implementação = ação, realização, por em prática, colocar a mão na massa, arregaçar as mangas, fazer acontecer;

resultados = efeitos esperados, tangíveis ou intangíveis, econômicos ou simbólicos, que não aconteceriam espontaneamente.

 

No contexto de uma organização específica, os resultados intermediários  das  inovações são produtos, processos  administrativos e operacionais, relacionamentos, sistemas e negócios,   que podem ser portadores de novidades em relação ao estado da arte ou apenas em relação a própria organização. Esses resultados podem representar uma ruptura com o que se pratica num dado momento ou um incremento de melhoria em algo conhecido. Como resultado final costuma- se citar, no caso de empresas, redução de custo, lucratividade, ampliação da sua fatia de mercado   e outros objetivos empresariais. Redução de custo, melhor qualidade dos serviços, melhor aplicação dos recursos arrecadados dos contribuintes, ampliação do espaço da cidadania são exemplos de resultados para um órgão governamental.

As inovações são fatos culturais como qualquer outro relacionado com a vida social, pois resultam do compartilhamento de idéias, crenças, valores, interesses e padrões de conduta, explícitos ou não, dos grupos sociais que as concebem, apóiam, implementam e utilizam. Elas refletem o modo de pensar e agir desses grupos, dialogando com o de outros grupos sociais ou combatendo.

Como se verá mais adiante, esse modo de entender os resultados das inovações não são mais suficientes diante das questões relacionadas com a sustentabilidade, que é a outra expressão polêmica, cuja compreensão do conceito e de seu alcance se apresenta como fundamental ao debate proposto. Por ora, pode-se entender que uma organização é inovadora quando introduz novidades de qualquer tipo em bases sistemáticas e colhem resultados esperados. A expressão bases sistemáticas significa que a empresa realiza inovações com autonomia, intencionalidade e proatividade. Como corolário tem-se que, para essa organização, a inovação é um elemento essencial do seu modus operandi, o que pressupõe o desenvolvimento contínuo de recursos, tangíveis e intangíveis, para inovar permanentemente.

Uma parte significativa do sucesso ou fracasso de uma organização em seu esforço inovador deve ser atribuída às características do seu meio externo, que envolve, além dos elementos mencionados, as características da indústria, a situação macroeconômica do país ou região e as políticas públicas, notadamente a de ciência, tecnologia e inovação – C&T&I.

Contudo, os autores ligados ao campo de conhecimento da administração enfatizam os aspectos internos da organização, que podem ser alcançados pelos esforços gerenciais. Nenhuma dessas linhas de pensamento desconhece a importância da outra, pois elas ocorrem pela necessidade de delimitar os objetos de pesquisas para torná-las exeqüíveis.

A metodologia MIS, adaptada pelo Fórum de Inovação em seus estudos, dá ênfase aos fatores internos sem, no entanto, desconsiderar os externos relacionados com o ambiente global e de transação onde a organização atua . Motivação, satisfação no trabalho, estímulo à criatividade, redução de conflitos entre gerências, liderança, comunicação interna, gestão de projetos de inovação, empreendedores internos, sistemas de recompensas, clima inovador são alguns temas relacionados com os condicionantes internos que estariam ao alcance da administração.

Em tese todos esses aspectos organizacionais podem ser tratados com vistas à criação de um meio inovador interno. Conforme mostrado no livro do Forum de Inovações da EAESP1, esse meio é um espaço organizacional onde a sinergia resultante da confluência de múltiplos fatores internos, como os citados acima, favorece a geração de inovações de modo sistemático. As possibilidades de que uma organização venha a ser inovadora, conforme  definido  acima,  depende, portanto, da convergência de fatores internos e externos favoráveis, como os citados anteriormente.

 

 

Organização Sustentável

O adjetivo sustentável como qualificador de uma organização apresenta muito mais dificuldades do que a palavra inovadora. A dificuldade começa com a própria palavra em si. Sustentável significa o que pode ou deve se sustentar, sendo que o verbo sustentar é transitivo direto, o que remete à pergunta: sustentar o quê? Sustentar também significa alimentar, nutrir e manter. O substantivo abstrato sustentabilidade indica a qualidade ou característica do que é sustentável e desse modo também requer complemento para ter algum sentido. Em relação a uma organização, pode-se, por exemplo, atribuir ao termo sustentável o significado de manter a sua capacidade de sobrevivência, continuar atuando no seu ramo de negócio ou conseguir continuamente os recursos de que necessita para continuar existindo e crescendo.

Ou seja, é preciso definir qual o objeto que deve ser sustentável para completar o sentido  da expressão organização sustentável, pois qualquer questão organizacional pode ser sustentável. Nos exemplos apresentados acima, a palavra sustentável tem conotações muito tradicionais no âmbito dos negócios apesar da roupagem nova, pois o que se quer sustentar é a capacidade para competir e continuar existindo, um objetivo recorrente de qualquer organização ontem, hoje e sempre.

Por exemplo, as  empresas feitas para durar, segundo Collins e Porras (1995), poderiam  ser consideradas sustentáveis sob a ótica da sobrevivência de longo prazo, pois as empresas que eles estudaram tinham sido criadas no século XIX e não só haviam  sobrevivido,  mas  continuavam muito atuantes nos seus setores. Se o que deve ser sustentado é um certo ritmo de inovações considerado adequado para a estratégia da empresa, então a definição de organização inovadora, apresentada acima, já contempla esse qualificativo. A organização que realiza inovações em bases sistemáticas é porque consegue manter ou sustentar um meio inovador interno bem articulado com o ambiente de C,T&I. Sustentável dessa forma refere-se ao próprio processo de inovação.

Conforme seu modo de ver, o adjetivo sustentável refere-se muito mais ao processo de inovação, entendido como um processo de aprendizado, do que aos resultados. A novidade dada por autores recentes está no processo de conceber a inovação como um aprendizado auto- organizado que leve em conta a demanda das partes interessadas (stakeholders).

As palavras sustentáveis e sustentabilidade começaram a ser empregada em meados da década de 1980, tendo como pano de fundo a crise ambiental e social que desde o início dos anos 1960 já era percebida como uma crise de dimensão planetária.

Neste contexto, o emprego da expressão organização inovadora apresenta dificuldades adicionais, seja porque sustentável e sustentabilidade são conceitos envoltos em polêmicas acirradas, seja porque entre os aspectos polêmicos estão as constatações de  que  o  estado avançado de degradação do Planeta se deve em muito às inovações que, como já mostrado, estão no cerne dos processos de desenvolvimento econômico capitalista.

Um impulso importante para a percepção dos problemas ambientais deveu-se ao movimento empreendido por Rachel Carlson contra o DDT, denominado por ela de elixir da  morte (Carson, 2002; p. 15), mas que havia sido considerado por muito tempo uma inovação de grande utilidade para a Humanidade pela sua eficiência no combate às pragas da agricultura e aos insetos propagadores de doenças epidêmicas. O CFC é apontado como exemplo de inovação que inicialmente mostrou-se benéfica ao substituir o gás de amônia em equipamentos de refrigeração, constatando-se mais de 10 anos depois que ele destrói o ozônio da estratosfera que protege  a  Terra das radiações ultravioletas do Sol. Este é apenas um exemplo de inovação que gera  problema ao meio ambiente físico, biológico e social e que, sob estes aspectos, seriam ambientalmente insustentáveis.

Também não faltam críticas ao fato de que muitas inovações não são necessárias e que o processo de destruição criativa representa desperdícios de recursos naturais e humanos. Milhares de inovações podem ser listadas para convencer alguém de que nem todas são úteis ou benéficas, embora para cada uma pode-se arrolar milhares de inovações que tornam a vida melhor,  aumentam a longevidade com saúde, aumentam a segurança alimentar e ampliam a capacidade de suporte do Planeta. A própria idéia de destruição criativa também pode ser entendida em muitos casos como benéfica à capacidade de suporte do Planeta, na medida que substitui processos produtivos poluidores e perdulários por outros mais limpos e poupadores de recursos naturais.

Quando se fala em melhorar a qualidade de vida de todos, respeitando a capacidade do Planeta de fornecer os meios para isso, está se falando de desenvolvimento sustentável.

 

Desenvolvimento Sustentável

Por desenvolvimento entende-se um processo de promoção da melhoria qualitativa das condições de vida da população de um país, de uma região ou de um local específico. As idéias a respeito de um desenvolvimento que respeite o meio ambiente foram amplamente propagadas a partir da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente Humano realizada em Estocolmo em 1.972. A expressão desenvolvimento sustentável começa a ser usada no início da década de 1.980, mas decola a partir de meados dessa década com os trabalhos da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como Comissão Brundtland, criada em 1.983 pela Assembléia Geral da ONU. Em 1.987 essa Comissão divulgou um relatório que ficou conhecido como Nosso Futuro Comum, na qual aparece a definição mais famosa de desenvolvimento sustentável, a saber:

desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades (CMMAD; 1.988, pg. 46).

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e  o  Desenvolvimento,  realizada no Rio de Janeiro em 1992, consagrou esse entendimento e a Declaração do Rio de Janeiro Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, aprovada durante a Conferência, a estabelece como um direito das pessoas e dos povos: o direito ao desenvolvimento deve ser exercido de   modo que atenda eqüitativamente às necessidades ambientais e  de  desenvolvimento  das  gerações presentes e futuras (Princípio 3). Complementando a definição acima, o Princípio 4 da Declaração estabelece que para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do meio ambiente deverá se constituir em parte integrante do processo de desenvolvimento e não devendo ser considerada de forma isolada. Vale mencionar que as declarações, enquanto formas de  tratados intergovernamentais, estabelecem princípios de Direito Internacional. Os princípios citados acima reforçam a idéia de que o desenvolvimento é um direito de todos conforme já havia sido proclamado pela Assembléia Geral da ONU de 1986:

o direito ao desenvolvimento é um direito inalienável do homem em virtude do qual toda pessoa e todos os povos têm o direito de participar e contribuir para o desenvolvimento econômico, social, cultural e político, e de beneficiar-se desse desenvolvimento, de modo que todos os direitos e liberdades fundamentais do homem possam ser realizadas plenamente (Resolução 41/128 de 04/12/86, Art. 1o).

A partir da Conferência do Rio de 1992 a expressão desenvolvimento sustentável e a definição acima passaram a ser usadas em praticamente todo o mundo e em todo tipo de organização, pelo menos entre as lícitas.

A Agenda 21, um documento aprovado na Conferência do Rio de Janeiro de 1992, dá o exemplo de como tratar as questões de modo desagregado, tais como assentamentos humanos, provimento de água doce, combate à desertificação, proteção da atmosfera, gerenciamento de resíduos perigosos, conservação da biodiversidade etc.

A Agenda dedica capítulos especiais para grupos de atores sociais que desempenham papel importante na busca desse novo modo de desenvolvimento, como as empresas (Capítulo 30) e a comunidade científica e tecnológica (Capítulo 31), entre outros. Pensar globalmente e agir localmente, uma espécie de lema difundido a partir dessa Conferência, não deve ser entendido apenas na sua dimensão espacial, mas também na dimensão da especificidade de cada segmento da sociedade. Por exemplo, na Conferência Mundial sobre a Ciência, organizada pela UNESCO em 1.999 em Budapeste, foi elaborada a Declaração Mundial sobre a Ciência para o  Século XXI: um novo compromisso, mais conhecida como Declaração de Budapeste, cujo preâmbulo inicia com as seguintes palavras:

“…todos vivemos no mesmo Planeta e formamos parte da biosfera. Reconhecemos agora que nos encontramos numa situação de crescente interdependência e que nosso futuro é indissociável da preservação dos sistemas de sustentação da vida no planeta e de sobrevivência de todas as formas de vida. Os países e os cientistas de todo o mundo devem ter consciência da necessidade urgente de utilizar responsavelmente o saber de todos os campos da ciência para satisfazer as necessidades e aspirações do ser humano sem empregá-los de forma incorreta. “ 

Muitas organizações produtivas, individualmente ou em associação, estão procurando encontrar um modo de se tornar atores relevantes de fato do desenvolvimento sustentável.  A  tarefa não é fácil, os tropeços são muitos e no centro do desconforto geral está a questão das inovações.

 

 

Como contribuir para o desenvolvimento sustentável inovando em bases sistemáticas? 

Uma questão complicada para qualquer organização, mas que se transforma numa espécie de nogórdio no caso das organizações empresariais. A estratégia de desagregar a sustentabilidade em dimensões gerenciáveis, a exemplo da Agenda 21, pode ser um meio para começar a desfazer esse nó.

A preocupação com o desenvolvimento sustentável está estreitamente relacionada com    as inovações pelo seu potencial de impacto sobre o meio ambiente e a sociedade. As inovações determinam o que será produzido, com que, para quem e como distribuir os  resultados  do esforço coletivo. Gerar inovações em bases sistemáticas, um componente do conceito de organização inovadora, como visto acima, pode ser tornar praticamente sinônimo de depredação em bases sistemáticas, tanto dos recursos naturais, quanto dos seres humanos, aqueles pela intensificação da sua exploração para atender as demandas geradas pelas novidades, estes pela exacerbação do individualismo que solapa as bases da solidariedade humana.

A definição de desenvolvimento sustentável, já mencionada, pode fornecer pistas para orientar as atividades inovadoras. Por exemplo, para que as gerações futuras possam satisfazer suas necessidades deve-se deter com urgência a degradação ambiental que atinge proporções gigantescas e que ameaça a própria vida no Planeta. Tomando como sinal de degradação ambiental o aquecimento global resultante da emissão antrópicas de gases de  efeito  estufa, deixar de contribuir para a concentração desses gases é uma atitude coerente com o conceito de sustentabilidade.

As novidades em termos de produtos e processos devem, portanto, ser planejadas para eliminar a emissão de tais gases. A eliminação das desigualdades sociais e regionais, que  refletem a má distribuição da apropriação dos recursos naturais, está presente nessa definição quando fala em atender a necessidade de todos, que não se resumem aos aspectos materiais da subsistência. Assim, todas as inovações de uma organização passariam a ter, entre os resultados esperados, desempenhos sociais e ambientais desejados. Lembrando a definição do Forum de Inovação, os resultados esperados são elementos essenciais do conceito de inovação.

Para operacionalizar o conceito de sustentabilidade, Ignacy Sachs, em  seu  livro Estratégias de transição para o século XXI, de 1993, desagrega o termo nas seguintes dimensões: sustentabilidade social, econômica, ecológica, espacial e cultural como visto em entrevista concedida a esta revista no seu número zero. A primeira refere-se à construção de uma sociedade com mais equidade, que seja capaz de reduzir as desigualdades sociais e regionais acima comentadas. Talvez o emprego mais antigo da palavra sustentabilidade se refira às questões econômicas, pois qualquer empreendimento e atividade duradouros precisam prover meios duradouros para se sustentarem. No sentido tradicional, sustentabilidade econômica refere-se aos fluxos de recursos necessários para sustentar ou manter a organização; no caso de uma empresa, são os retornos positivos na forma de lucro e os financiamentos de terceiros, no caso de uma organização não lucrativa, as receitas de venda bens e serviços, doações, subvenções etc.

Para os objetivos de desenvolvimento sustentável é necessário incluir uma preocupação com o uso eficiente dos recursos naturais. Este um dos aspectos mais polêmicos da sustentabilidade, uma vez que todos os recursos de que os sistemas econômicos necessitam dependem do meio ambiente, pois para produzir os bens e serviços para prover o sustento das sociedades humanas é necessário utilizar recursos da natureza.

A sustentabilidade ecológica  refere-se às ações  para aumentar a capacidade de suporte  do Planeta para fins socialmente válidos, intensificando o uso dos recursos potenciais dos vários ecossistemas com o mínimo de danos aos sistemas de sustentação  da  vida. Entre os  exemplos para alcançar tal sustentabilidade, Sachs cita as seguintes: limitação do consumo de combustíveis fósseis e outros recursos esgotáveis, redução da poluição, autolimitação do consumo material nos países ricos e definição de regras adequadas para a proteção ambiental.

A sustentabilidade espacial, refere-se à busca de uma configuração rural-urbana equilibrada e uma melhor solução para os assentamentos humanos; enquanto a sustentabilidade cultural relaciona-se ao respeito que deve ser dado às diferentes culturas e às suas contribuições para a construção de modelos de desenvolvimento apropriados às especificidades de cada ecossistema, cada cultura e cada local . A sustentabilidade cultural enfatiza a pluralidade de soluções e isso se contrapõe à visão unidirecional do conceito de progresso técnico que se baseia apenas no avanço do conhecimento científico.

Pluralismo exige não só respeito entre culturas e suas práticas, mas interação  e  aprendizado conjunto. De acordo com o relatório Nossa Diversidade Criadora, elaborado pela Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento da UNESCO, as formas de desenvolvimento  são determinadas, em última análise, pelos fatores culturais, por isso, não faz sentido falar de desenvolvimento e cultura como conceitos separados e estanques, já que o desenvolvimento e a economia fazem parte ou constituem aspectos da própria cultura de um povo.

Às cinco dimensões de sustentabilidade apresentadas acima, deve-se acrescentar a sustentabilidade política e institucional, entendida como fortalecimento das instituições democráticas e a promoção da cidadania.

Vale ressaltar que a promoção do desenvolvimento sustentável não deve ser um projeto do governo, mas da sociedade como um todo, o que leva a necessidade de assegurar a participação efetiva de todos os seus segmentos.

O Relatório Nossa Diversidade Criadora, citado anteriormente, fala em sustentabilidade fiscal, administrativa e política para obter o consentimento dos cidadãos em torno dos projetos  de desenvolvimento. As instituições políticas devem ser capazes de superar as resistências de  modo legítimo e o aparato administrativo deve estar apto para conduzir as reformas de modo continuado, o que pressupõe a existência de recursos para arcar com os dispêndios públicos. Faz parte da dimensão política a construção de relações harmoniosas e cooperativas entre  as  diferentes esferas de ação governamental, quer com os demais entes da federação, quer internamente, entre os diferentes órgãos governamentais, evitando superposições de funções e conflitos impertinentes. A constituição ou o fortalecimento de sistemas  nacionais de inovações  faz parte dessa dimensão.

 

O Triple Bottom Line

 Para indicar os resultados desejáveis para as organizações empresariais sob  a perspectiva do desenvolvimento sustentável, tem sido bastante divulgado o esquema conhecido por triple bottom line, uma expressão  atribuída a SustentaAbility, uma empresa de  consultoria britânica,  mas que se tornou de fato popular no ambiente empresarial a partir de 1.997 com o livro Canibal Whit Forks: the Triple Bottom Line of 21th Century Business, de John Elkington, um dos fundadores dessa empresa. Com esse título sugestivo e provocador, Elkington entende que o capitalismo corporativo, o canibal, se tornaria civilizado, por assim dizer, se usasse garfo, um  garfo de três dentes, cada um representando as três linhas que  resumem  os  resultados econômicos, sociais e ambientais, daí a expressão triple bottom lines.

Por esse esquema, a empresa para se tornar civilizada, ou sustentável, deveria alcançar resultados econômicos, sociais e ambientais. Não se trata de uma idéia original, pois muito antes, Maurice Strong, Secretário do CNUMAD, já havia mencionado que para alcançar o desenvolvimento sustentabilidade seria necessário obedecer simultaneamente os seguintes critérios: eqüidade social, prudência ecológica e eficiência econômica..

Esses três critérios também fazem parte da abordagem dos 3Es de A. R. Edwards, em seu livro The sustainability revolution: portrait of a paradigm shift de 2005, onde: ecologia/meio ambiente (environment), economia/emprego e equidade e igualdade (equality), acrescida de mais um e, de educação . Em relação às organizações, Edwards recomenda diversos instrumentos de gestão, como a avaliação do ciclo de vida, o princípio da precaução e o uso de critérios   ecológicos para projetar produtos, entre outros.

Apesar de considerar três dimensões, o autor dá mais ênfase às questões concernentes à ecologia e meio ambiente. A sua abordagem aplica-se a todos os níveis de abrangência, do internacional ao local, e a todos os tipos de organizações e não apenas as lucrativas, como na abordagem original de Elkington. Vale mencionar que essa abordagem tem sido adaptada para o contexto dos governos locais, como os casos das cidades de Melboune e Christchurch, na Austrália e Nova Zelândia.

A importância dos conceitos apresentados por Elkington está em propor caminhos específicos para as empresas se tornarem sustentáveis naquelas três  dimensões, caminhos que  para este autor se apresenta em sete revoluções da sustentabilidade, sendo  que a primeira enfoca   o mercado, que é o grande orientador para as empresas, mas um mercado modelado pelos  governos para promover a internalização dos custos relativos a essas três dimensões.

Os resultados econômicos, desde as partidas dobradas atribuídas a Lucca Pacciolo no século XIV, são expressos pelo lucro ou prejuízo mostrado na última linha de um demonstrativo contábil. A inclusão do conceito de sustentabilidade econômica requer que os resultados econômicos considerem tanto o capital físico e financeiro, como é tradicionalmente feito, quanto   o capital humano na forma de conhecimentos e o capital social, na forma de reputação e credibilidade. As duas outras bottom lines devem representar os resultados ambientais e sociais resultantes das atividades da empresa: o primeiro levando em conta o balanço entre o capital natural e os custos ambientais internalizados decorrentes das atividades da corporação; o segundo, os resultados dos investimentos para atender as demandas sociais e que resultem na ampliação do capital social e, portanto, da confiança que a sociedade depositará na corporação.

Embora essas três dimensões não sejam completamente redutíveis às seis comentadas acima, elas podem servir de critérios para a definição do que se espera, minimamente, de uma  OIS, enquanto ator efetivo no desenvolvimento sustentável, como coloca a Agenda 21  no  Capítulo 30.

Há muitos problemas com esse último esquema, mas que não serão aqui objetos de discussão. Apenas para citar um deles, a eficiência econômica deveria, seguindo a orientação de Sachs, ser avaliada em termos macrossociais e não apenas do ponto de vista da lucratividade microempresarial. É importante assinalar o ceticismo de Norman e MacDonald, em sua obra Getting to bottom of triple bottom line, de 2.004, para quem essa abordagem pode se tornar na prática um único bottom line acrescido de vagos comprometimentos de ordem social e ambiental, constituindo um prato cheio para facilitar a hipocrisia por parte das corporações.

A figura de um triângulo isósceles, em que cada lado é um bottom line em igualdade de importância com os demais, dificilmente representa a realidade de uma organização específica, pois num dado momento uma dimensão apresenta-se mais forte do que outra. Em se tratando de empresas, os resultados  econômicos tendem a ser enfatizados, apesar da retórica das estratégias  do tipo ganha-ganha apregoadas insistentemente pelas empresas de consultoria, como a SustainAbility e ONGs ambientalistas empresariais, como a World Business Council for Sustainable Development (WBCDS).

Há quem veja nisso um motivo a mais para descrer da sinceridade dos empresários e dirigentes empresariais com respeito aos problemas socioambientais e, conseqüentemente, das possibilidades das empresas de se tornarem realmente parceiras do desenvolvimento sustentável.

Embora isso seja verdade para muitos casos, uma explicação plausível para  o  descompasso entre a dimensão econômica e as demais se deve aos fatores resultantes de decisões anteriormente tomadas e que se traduzem no presente como limitações por representar investimentos com longa vida útil remanescente, bem como pela percepção condicionada pelo aprendizado obtido no passado.

Os efeitos que Freeman e Soete, em The economics of industrial innovation, de 1.997 denominam de lock-in (efeito de trancamento) referem-se ao fato de que freqüentemente as tecnologias em uso apresentem vantagens econômicas sobre as novas ainda não implementadas. Esse fato explicaria porque as empresas preferem as tecnologias de controle da poluição no final do processo (end-of-pipe) em vez das novas tecnologias limpas.

No longo prazo, a solução é encorajar as inovações que reduzem a quantidade de insumos por unidade produzida. Por isso, esses autores consideram que as políticas públicas voltadas para promover o desenvolvimento sustentável devem contemplar um amplo espectro de políticas públicas complementares para apoiar os investimentos em novas tecnologias e em sua rápida difusão.

Uma organização inovadora, conforme definido acima, teria muito mais condições para superar esses e outros tipos de limitações, mas nunca de forma isolada as oportunidades tecnológicas sempre possuem componentes exógenos, em maior ou menor grau dependendo do setor de atividade.

Para que as empresas possam ter sucesso nessa empreitada é necessário  condições  externas favoráveis, que por sua vez dependem de políticas públicas de C,T&I coerentes com os objetivos do desenvolvimento sustentável. Contudo, a baixa prioridade dada à área de C&T por parte dos sucessivos governos indica um descompasso entre a sociedade e o Estado.

O desenvolvimento científico e tecnológico não é neutro no sentido de descompromissado de interesses e valores. Por exemplo, a revolução verde, um conjunto de inovações gerou resultados significativos em termos econômicos para os seus adotantes e espantou até o momento  o fantasma da fome que desde Malthus atormenta uma parcela significativa da Humanidade, mas às custas de graves problemas ambientais e sociais, como a concentração fundiária e o êxodo de grandes massas de camponeses para as periferias urbanas.

Para alcançar desempenhos significativos nas dimensões da sustentabilidade é necessário desenvolver conhecimentos que permitam o surgimento de inovações economicamente viáveis, ambientalmente saudáveis e socialmente inclusivas e incentivem a sua adoção por parte dos agentes econômicos.

 

 

Responsabilidade Social Corporativa 

Os conceitos apresentados anteriormente remetem ao tema da responsabilidade social empresarial ou corporativa (RSC), que também não é novo, mas que alcançou a dimensão de um movimento planetário a partir dos anos 1.990. Para citar Carroll, em A three-dimensional conceptual model of corporate performance, de 1.979, apesar de inúmeros trabalhos sobre RSC desde a década de 1930, foi a partir de um texto de Milton Friedman de 1962, que afirmava ser a doutrina da RSC fundamentalmente subversiva, que o debate sobre este tema realmente decolou.

O conceito de RSC defendido por este autor já se encontrava na obra fundadora da economia capitalista, A riqueza das Nações, de Adam Smith, do século XVIII, pelo qual o bem estar coletivo resultaria das infindáveis ações que cada pessoa realiza conforme seu próprio interesse. Conforme suas palavras, ao perseguir seus próprios interesses, o  indivíduo  muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que quando tenciona  realmente promovê-lo . Essa idéia é defendida com outras palavras por Friedman em Capitalismo  e Liberdade, a obra onde se encontra a polêmica acusação feita à RSC de que fala Carroll,  a  saber:

há poucas coisas capazes de minar tão profundamente as bases de nossa sociedade livre do que a aceitação por parte dos dirigentes das empresas de uma responsabilidade social que não a de fazer tanto dinheiro quanto possível para os acionistas. Trata-se de uma doutrina fundamentalmente subversiva (FRIEDMAN, 1.982; p. 123, grifo nosso).

Para o grande público, principalmente o empresarial, as idéias de Friedman com respeito à RSC ficaram realmente conhecidas com um artigo de poucas páginas publicado num jornal dominical de grande tiragem, no qual afirma de modo categórico que a responsabilidade social da empresa é gerar lucros dentro da lei.

Ou seja, qualquer aplicação de recursos que não seja para esse fim deve ser condenada. Se os dirigentes e acionistas entendem que é preciso contribuir para com as questões sociais, que façam com seus recursos, não  com os da empresa. A função desses dirigentes é maximizar o  lucro. O argumento é o seguinte: se a empresa está tendo lucro dentro da lei é porque está produzindo um bem ou serviço socialmente importante e, com isso, ela pode remunerar os fatores de produção, gerando renda para a sociedade e impostos para os governos que, estes sim, devem aplicá-los para resolver problemas sociais.

Esse entendimento a respeito da RSC, que ainda encontra muitos defensores nos meios empresariais conservadores, faz parte de um período que se esgota na década de 1950, como obsevou Tenório, em Responsabilidade social empresarial: teoria e prática, de 2004, na qual a responsabilidade social das empresas apresenta uma dimensão estritamente econômica, ou seja, gerar lucros, criar empregos, pagar impostos e cumprir suas obrigações legais. Para Tenório, tal entendimento já não seria mais suficiente para orientar os negócios diante de novos valores requeridos pela sociedade pós-industrial, como a busca de qualidade de vida, valorização do ser humano, respeito ao meio ambiente .

Assim, outras abordagens sobre este tema surgiram, como a de Carroll para quem as empresas se defrontam com quatro responsabilidades: estar em conformidade com as leis, serem rentáveis, éticas e filantrópicas.

De acordo com a Comissão da Comunidade Européia de 2.002, a RSC é um conceito por meio do qual as empresas integram preocupações sociais e ambientais às operações dos seus negócios e nas interações com outras partes interessadas.

Com a inclusão da dimensão social e ambiental cria-se uma ponte com o conceito de organização sustentável, que seria a organização que simultaneamente procura ser eficiente em termos econômicos, respeitar a capacidade de suporte do meio ambiente e ser instrumento de justiça social (inclusão social, proteção às minorias e grupos vulneráveis, equilíbrio entre gêneros etc).

A propósito, a norma brasileira NBR 16.001:2004 assim define responsabilidade social: relação ética e transparente da organização com todas as suas partes interessadas, visando o desenvolvimento sustentável .

O conceito de organização sustentável envolve o de RSC, na medida em que esta é um meio para que a organização contribua para atender as necessidades do presente  sem  comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras, conforme a famosa definição da CMMAD (1.988).

Em outras palavras, a RSC é meio e não fim, pois diz respeito ao que deve ser feito  e  como deve ser feito com o intuito de contribuir para alcançar o desenvolvimento sustentável, um novo modo de conceber o desenvolvimento que, apesar de muitas dúvidas e inconsistências sobre  o seu entendimento, como exemplificado anteriormente, está sendo construído coletivamente por meio de um movimento de caráter planetário.

 

 

INOVAÇÃO NO CENTRO DE DEBATES 

As inovações constituem uma peça chave para que as  organizações  possam contribuir  para o desenvolvimento sustentável, pois o que está em jogo é um novo modo produção da subsistência humana que seja compatível com a capacidade de suporte do Planeta e que seja eqüitativo, pois as disparidades de renda entre regiões, povos e classes é o outro lado de uma apropriação desigual dos recursos da Terra, que a princípio deveriam servir para todos.

Alcançar esse tipo de desenvolvimento é tarefa para todos que entendam que o estado de degradação ambiental e social está chegando a ponto de não haver mais retorno. As Metas do Milênio promovida pelas Nações Unidas dão uma mostra do enorme esforço que será necessário para começar a reverter essa situação e criar um mundo mais justo, mais pacífico  e  mais  próspero. A Declaração do Milênio, aprovada durante a Cúpula do Milênio realizada em Nova York em 2000, hoje adotada pelos 191 Estados que integram as Nações Unidas, estabeleceu oito metas e 18 objetivos a serem alcançados até 2015 como, por exemplo, reduzir pela metade a população com renda inferior a US$ 1.00 por dia, reduzir pela metade a população que passa  fome, reduzir pela metade a população sem acesso a água potável, entre outros. Note que os objetivos citados falam em reduzir pela metade e não a totalidade e mesmo assim  são  considerados ambiciosos dada as dificuldades previstas para alcançá-los2.

Para serem parceiras desse esforço, as organizações devem se tornar inovadoras e sustentáveis, entendendo que a palavra sustentável está relacionado com uma concepção socioambiental de desenvolvimento e não apenas com o sucesso na obtenção de condições de competitividade, que é um dos sentidos triviais dado ao termo.

Assim, pode-se dizer que uma organização inovadora sustentável não é a que introduz novidades de qualquer tipo, como definido provisoriamente em outra seção, mas sim a que introduz novidades que atendam as múltiplas dimensões da sustentabilidade em bases sistemáticas e colhem resultados esperados para ela, para a sociedade e para o meio ambiente. 

Não só o processo de inovação deve ser sustentável, mas os resultados esperados devem referir-se às dimensões da sustentabilidade consideradas em seu conjunto, com o máximo de equilíbrio entre elas. As dimensões da sustentabilidade conforme aqui  comentadas  passam a ser os balizadores das atividades inovadoras, constituindo-se numa espécie de filtro para selecionar idéias, inventos, modelos e planos a serem implementados. Isto posto, conclui-se que não faltam razões e modelos para se enfrentar o debate, faltam agentes dispostos a olhar adiante e implementá-los.

 

1 BARBIERI, J.C. Organizações inovadoras: estudos e casos brasileiros. R.J. Editora FGV, 2003.

2 As Oito Metas  do Milênio são as seguintes:  (1) erradicar a extrema pobreza e a fome;  (2) atingir a universalização  do ensino fundamental; (3) promover a igualdade entre os sexos e a autonomia da mulher; (4) reduzir a mortalidade infantil; (5) melhorar a saúde humana; (6) combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; (7) garantir a sustentabilidade ambiental; (8) promover uma parceria mundial para o desenvolvimento. Mais sobre as Metas do Milênio, ver: http://www.un.org/spanish/millenniumgoals/index.htm.

 

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